Novo CPC

Este blog foi criado como uma tentativa de ampliar a discussão sobre a proposta de um novo Código de Processo Civil.
A alteração de uma lei dessa relevância não pode ser conduzida em regime de urgência e é necessário que os operadores do Direito, entre outros setores da sociedade, sejam mais atentamente ouvidos.
Esperamos, assim, oferecer aqui alguma colaboração.

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Abertura: Um novo CPC, a morosidade da Justiça e a informatização.

Inauguramos aqui mais um espaço na Internet, desta vez com o objetivo de discutir a proposta de um novo Código de Processo Civil. O projeto está tramitando no Congresso Nacional a uma velocidade no mínimo temerária. Uma lei desse porte mereceria uma discussão mais lenta e profunda, e especialmente desprendida de paixões pessoais. Nem deve uma lei processual ser votada em caráter emergencial, como se fosse destinada a solucionar situações de caos social. Não é que a situação em que se encontra a justiça brasileira não seja suficientemente delicada, mas é necessário refletir com muito cuidado em que medida uma ampla e longa lei, como é o caso de um novo CPC, é capaz de solucionar o problema da morosidade, ou se não pode ainda agravá-lo.

Mesmo em situações de real urgência, legislar precipitadamente e sob a pressão das paixões do momento nunca deu bons resultados, haja vista, por exemplo, o histórico de leis - tipicamente emergenciais - que já regeram a locação urbana no país, sem nunca solucionar o problema de moradia ou os incansáveis atritos entre locador e locatário que, diga-se, só minoraram com a estabilização da economia nacional.

Utilizando-me de conhecida metáfora médica, prescrever um remédio é algo relativamente fácil: o difícil é fazer o prévio e correto diagnóstico da doença. Sabido qual é o mal que acomete o paciente, é só escolher o remédio indicado para aquela enfermidade.

A morosidade do processo é apenas o sintoma de uma doença, tal qual o estágio febril de um ser vivo. Mas o que causa essa febre? Se não for atacada esta causa, com os remédios corretos, os sintomas evidentemente permanecerão, e o doente pode até mesmo piorar... ou morrer.

O atual CPC sofreu intensas reformas nos últimos 16 anos, todas invariavelmente apresentadas como destinadas a combater a morosidade. E a morosidade não foi solucionada com isso. Parece mais do que claro que o problema da lentidão não era o CPC de 1973, nem em sua redação original, nem na que se encontra atualmente em vigor, depois de intensa reforma. Não que a lei não possa ser alterada, por razões outras, e várias foram as boas alterações que tivemos nesses anos; nem todas, porém, são merecedoras de elogios, e quase nenhuma verdadeiramente atacou o problema da demora.

Algumas esferas do Poder Judiciário, que nestes últimos anos investiram decididamente em infraestrutura e organização (e contaram com recursos financeiros para tanto), lograram, mesmo com esta lei que temos, obter ganhos visíveis em prol da celeridade, o que é mais um indicativo de que a lei atual não é óbice à celeridade.

Por outro lado, quando se observa o que acontece no Estado de São Paulo, que concentra cerca de 40% do movimento forense nacional (sem que sua capacidade física e humana corresponda ao mesmo percentual da estrutura judiciária nacional), é difícil embalar a idéia de que um novo CPC possa significar qualquer expectativa de melhoria, mínima que seja, para a insuportável demora hoje vivenciada.

Quando meses são necessários para uma mera juntada de petição, expedição de guia de levantamento ou de um outro mandado qualquer, ou somente para certificar o trânsito em julgado da sentença, é de se indagar o que uma lei - qualquer lei, qualquer que seja seu texto - pode oferecer para sanar esses males. Há excesso de recursos? Pode ser que sim! Mas processos já demoram anos em primeiro grau de jurisdição, sem que tenha sido apresentado qualquer recurso! Alterar regimes recursais não vai, por certo, solucionar esse tipo de problema, que se tornou regra absoluta em todos os órgãos judiciais das justiças estadual e federal de São Paulo (e provavelmente de outros lugares, mas reservo-me a falar do que conheço com mais intimidade...).

Mas o que mais sugeriria a prudência de esperar um pouco mais, antes de se propor, ou de se aprovar, um novo Código Processual, é a recente inserção de novas tecnologias no processo. A informatização, mais do que uma mera alteração da forma, pode significar um caminho para se revolucionar também o modo de ser do processo. Diante disso, é de se pensar se não estaremos despendendo esforços inutilmente neste momento, discutindo, aprovando e colocando em vigor uma lei que pode se tornar obsoleta em poucos anos, tão logo os tribunais estejam amplamente informatizados.

É com esses olhos que vejo esses recentes esforços para a criação de um novo CPC. Coubesse a mim a escolha, não se faria alteração alguma na lei processual até que fosse possível vislumbrar um novo processo, calcado na ampla informatização judicial. Tratei desse possível impacto das novas tecnologias sobre o modo de ser do processo em minha tese de livre-docência, recém apresentada e ainda não defendida, razão pela qual convém abster-me de adiantar aqui os seus detalhes, ao menos por ora.

Se, porém, há um projeto em trâmite, vamos, então, discuti-lo aqui. Se o projeto em trâmite é uma realidade, só nos resta utilizar este espaço para analisar, discutir, elogiar ou criticar as específicas propostas do texto que se encontra no Congresso Nacional. Sem deixar de lado essa posição inicial - que fiz questão de declinar nesta minha mensagem inaugural, no sentido de que uma nova lei não é oportuna no presente momento - se temos um projeto, vamos discuti-lo!

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